Tecidos sustentáveis, a missão

05/11/2012 00:00

Tecidos sustentáveis, a missão

Imagem: Criptic Clothing Label, de Wm Jas, no Flickr, sob CC: By-SA

Coisa rara: o release entrou na caixa postal e eu deixei por lá para investigação. Já tem algum tempo que leio sobre tecidos sustentáveis, algodão orgânico e correlatos. Nada muito científico, confesso. Nos feeds encontrei um post no blog da Ecotece exatamente sobre a empresa que enviou, a Lenzig. Coincidência nenhuma, certo?

Enquanto por lá eles falam da necessidade de tecidos sustentáveis, o release (chato, inclusive, mas quase todos são) fala dos tecidos com baixo impacto ambiental. Ô Jorge, me socorre aqui e conta: como é que a gente sabe se é verdade?

Porque eu fiquei em dúvida:

  1. A pesquisa do Instituto Holandês foi feita com exclusividade (comprada, portanto) pela empresa.
  2. Citação direta do release: com o lançamento do Tencel®2012 (em 2012), a Lenzig irá deter todo o processo mundial de extração, beneficamento e produção de sua matéria-prima, estabelecendo sua linha de produtos têxteis como a que menor impacto causa ao meio ambiente.

Ok, o pessoal da Ecotece, que tem um trabalho reconhecido, diz que é bacana, talvez seja mesmo. Mas a minha cabecinha desconfiada vê, basicamente, benchmarking. Repare comigo no release:

As fibras celulósicas produzidas pela empresa apresentam melhores perfis ambientais quando comparados ao algodão e poliéster, proporcionando em seu processo produtivo de 1,5 a 5 vezes mais economia no uso de energia não-renovável.

Antes da gente seguir, esclareço: os produtos da fábrica são feitos para serem misturados a outros – inclusive ao poliéster que eles tanto “criticam”. O algodão “normal”, para quem não sabe, causa enormes problemas ambientais, principalmente pelo uso de pesticidas, fertilizantes e acidificação dos solos, sem falar no consumo de água.

Fui buscar uma definição para fibra celulósica. Com o “define” só voltou o glossário da American & Efird , uma tecelagem americana:

Cellulosic Fiber: A fiber made from plants – a wood pulp by-product. Cellulosic fibers include Cotton, Rayon and Tencel® or Lyocell®. These fibers have similar physical properties in that they have a relatively low tenacity, a low elongation, and good heat resistance. They are not as durable to abrasion, laundering, and chemicals as polyester or nylon fibers.

Traduzindo por cima: fibras feitas de plantas – derivados da polpa de celulose – as fibras celulósicas incluem algodão, rayon, Tencel®, Lyocell®. Estas fibras têm propriedades físicas semelhantes: baixa tenacidade, baixa elasticidade e boa resistência ao calor. Elas não são tão duráveis à abrasão, lavagens e químicos quanto as fibras de poliéster ou nylon…

Na busca sobre “sustainable textiles” fui mais feliz. Encontrei não só o querido Inhabitat falando de produtos que, daqui, parecem muuuuito mais legais que estas fibras, mas também o GreenBlue, uma organização independente fundada por um arquiteto norte-americano e um químico alemão, que tem um projeto de criar Standards para a produção sustentável nesta indústria. E os parâmetros, meus anjos, são altos:

The Sustainable Textile Standard offers an ambitious paradigm for textiles of the future. To attain the highest level of achievement described by the STS, a truly sustainable textile would meet or exceeds all industry performance and cost requirements, delight the end user through pleasing aesthetic and tactile qualities, and would meet the following enhanced quality profile:

•     All materials and process inputs are safe for human and ecological health in all phases of the product life cycle

•     All energy, material, and process inputs come from renewable sources

•     All materials are capable of returning safely to either natural (biological nutrient) or industrial (technical nutrient) systems

•     All stages in the product lifecycle actively support the reuse or recycling of these materials at the highest possible level of quality

•     All persons involved with the creation of textiles are treated fairly with respect to human rights and given training to increase their mastery of this craft

Taí um texto que enche meu coração de esperança nesta humanidade. Será que sai do papel pra virar realidade? Acho bacanérrimo a gente produzir fibras tecnológicas (se possível economizando ao máximo o meio ambiente) do que quer que seja. E pessoalmente prefiro estes Padrões de produção à dominação mundial por uma única empresa. Afinal, diversidade é fundamental para um meio ambiente saudável.

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Modelito da Osklen, que jura que usa tecido orgânico. Imagem: Michel Zappa (CC-BY-SA) no Flickr

Depois do post anterior sobre tecidos sustentáveis, segui navegando um pouco e encontrei algumas informações bacanas para compartilhar com vocês.

Linda Sones publicou um artigo interessante sobre os tecidos no Natural Matters, da Inglaterra: os tecidos mais sustentáveis…

Algodão

Esta é uma fibra sensacional para roubas, mas o cultivo tradicional do algodão causa problemas tanto ao meio ambiente quanto aos trabalhadores por conta do uso de pesticidas e inseticidas que causa doenças e espalha a poluição nos lençóis freáticos.

O algodão orgânico é cultivado sem uso destas técnicas e não causa estes distúrbios, mas requer muito trabalho – e o campo tem que estar livre dos aditivos químicos pelo menos por três anos antes do produto ganhar a certificação. A demanda global pelo algodão orgânico cresce exponencialmente e a grande questão hoje é como produzir o suficiente para atender a todos. La Rhea Pepper, do Organic Exchange, declarou a Linda: “Para encorajar a produção das fibras orgânicas precisamos discutir e implantar modelos que reconheçam o valor do produto dos limites das fazendas até o final da cadeia produtiva.”

Cânhamo

Sim, a planta produz fibras vestíveis, além do produto ilegal – e é uma das matérias primas mais promissoras. É altamente produtiva sem uso de pesticidas ou inseticidas e melhora o solo onde é cultivada. É resistente e pode ser plantada em quase qualquer clima. O tecido pode ser feito quase sem uso de produtos químidos e como não pede grande tecnologia para ser feito, pode ser realizado na fazenda, aumentando o emprego e reduzindo os custos de transporte e poluição decorrentes.

O Cânhamo tem sido usado como matéria prima para tecidos há milênios e só recentemente se tornou controverso. Como a planta também produz maconha é ilegal nos Estados Unidos (no Brasil também) mas é cultivada legalmente na Europa, Ásia e Canadá.

Bambu

O tecido produzido a partir do bambu tem grande suavidade – é comparado ao cashmere. Como a planta cresce rápido e fácil, é em grande parte naturalmente orgânico. Não precisa ser replantado depois da colheita e cresce novamente a partir das raízes. Como o cânhamo, ele melhora a qualidade do solo e ajuda a reconstituir os efeitos da erosão.

Há duas formas de fazer tecido a partir do bambu: mecânico ou químico. O método mecânico pede que se prense a parte da madeira e depois se acrescentam enzimas naturais que produzem uma polpa que pode ser “penteada” e tecida. O resultado deste processo costuma ser chamado de “tecido de bambu”. E uma minúscula parte da produção destina-se ao vestuário porque o método exige muito trabalho e é caríssimo.

O tecido de bambu usado para vestuário é em grande parte resultado do processo químico, que é feito através do “cozimento” das folhas e ramos em hidróxido de sódio e dissulfato carbônico (hidrólise por alcalinização combinada ao bleaching) . Este processo causa muitos problemas de saúde. Em baixa quantidade, cansaço, dores de cabeça e problemas nervosos. O dissulfato carbônico é indicado como origem dos problemas nervosos de trabalhadores na produção de rayon… Exatamente por conta disso é considerado prejudicial ao meio ambiente e não é sustentável nem ecológico. A boa notícia é que há novos jeitos de produzir a fibra de bambu. Por isso mesmo, antes de comprar, olhe a certificação – Oeko Tex, Soil Association, Skal, Krav ou qualquer similar.

Soja

Além de ser bacana para o corpo e a alimentação, a soja produz um tecido famoso por sua suavidade, conforto, brilho e caimento – que se combinam à lavagem fácil e durabilidade. É mais caro que o algodão orgânico ou cânhamo e tornou-se um produto de luxo. Outro ponto positivo é que é produzido com as sobras da indústria alimentícia. Existe alguma soja certificada – mas pouquíssima.

A pesquisa sobre o plantio de soja, claro, não leva a nenhum resultado positivo. Só aqui no Brasil a gente sabe bem o que as plantações têm feito ao cerrado e à Amazônia. Sem falar que grande parte das plantações usam sementes geneticamente modificadas (a tal soja transgênica que é usada na Argentina e aqui também). Esta prática causa danos aos rebanhos e plantações vizinhas. Em menos de uma década, as plantações de soja expulsaram gente do campo e causam sérios desequilíbrios ecológicos e agrícolas, detonam a segurança alimentar e levam à dependência de tecnologia controlada por duas ou três multinacionais. Antes de comprar qualquer coisa produzida com este tecido vale verificar a certificação orgânica.

Para saber mais sobre tecidos orgânicos (em português)

foto: Michell Zappa, no Flickr